Fair play do universo

Daí que, durante uma rotina comum, recebo uma dessas correntes que dizia uma oração bonita e afável sobre como às vezes pedimos nada daquilo que precisamos, sobre como tudo deve ter sua hora certa de acontecer. Aquilo começava a me inserir novamente na fé, recostava minha cabeça de lado nos ombros largos de Deus e dizia ‘tá tudo bem agora’. Mas, como sempre, ao final de toda essa limpeza espiritual, a multa:

AGORA ENVIE ISSO PARA 12 PESSOAS E VOCÊ TERÁ UMA SURPRESA MARAVILHOSA.

Em primeiro lugar, escolher 12 pessoas já é difícil para alguém que tem poucos amigos e relativos em contato próximo. E mesmo aqueles com algum contato, soa meio estranho mandar uma corrente, afinal, você sabe qual é a fama dessas pessoas que repassam correntes, certo? Eu jamais confiaria novamente em mim. Embora isso eu não tenha tanto que julgar, haja vista o terror psicológico que a última frase dessas correntes nos impõem.

Depois tem tudo isso de não querer mandar para os amigos ateus, agnósticos, ou que estão pouco se importando para a existência de Deus. São boas pessoas, acredite, mas simplesmente não se importam em pedir, agradecer etc. Você pode imaginar como seria copiar eles todos no e-mail, o fórum de discussão que aquilo ia se tornar? Bem, pelo menos todos eles reencaminhariam a mensagem entre si por meio das respostas anteriores, ainda que de uma maneira inconsciente.

Eu gostaria muito de ser benevolente e encaminhar os emails que me pedem. Acredito que isso me traria estabilidade mental, além de esfriar a cabeça, sério, não estou muito me importando para aquela surpresa maravilhosa que vai me acontecer em cinco minutos ou sete dias. Só o fato de tirar isso da minha cabeça já seria o suficiente. Pra você ver: Eu comecei a ler o e-mail tão empolgado e acolhido e terminei querendo que ele nunca tivesse existido.

O problema é que consigo lembrar de cabeça três ou quatro pessoas que receberiam isso sem pestanejar, sem me questionar se eu voltei a tocar na missa, essas coisas. Não consigo simplesmente mentir para os bancos de dados de Deus e encaminhar a mensagem reconfortante para meus quatro ou cinco emails pessoais, por exemplo, só pra fazer volume nas contas. Não é por mal, imagine, só quero acreditar que o universo trabalha em fair play comigo da mesma forma que eu trabalho com ele, entende?

Radiohead, The King of Limbs, 2011

Esse novo disco do Radiohead saiu sem frescura, rápido, sem mística, capa num dia, track list no outro, teaser no outro e due no sábado. ‘Sem frescura’ porque não deve ter sobrado nada depois da gravação do disco. Não consigo me lembrar com exatidão quando foi que o Radiohead perdeu a mão pra situar você nesse meu pensamento, portanto, abaixo segue o meu faixa a faixa:

The King of Limbs abre com ‘Bloom’, uma espécie de samba-jazz que para não dizer inrotulável e criar um termo novo, vou apenas deixar assim. ‘Bloom’ tem uma vibe das músicas do Otto que todo mundo idolatra e você não se enxerga suportando mais que um minuto completo. Acho que se eu começar a usar a palavra experimentalismos não vou mais parar até o final do texto, portanto, digamos que todas as músicas soam experimentais.

Apesar disso, de minha parte nem tudo são críticas. A voz de Thom Yorke continua remetendo a uma época em que o Radiohead ainda era uma banda e não essa tribo indígena tentando acertar sempre. Difícil mesmo foi ouvir ‘Morning Mr. Magpie’ sem querer desligar o player. Repetitiva e ultrapassada. Eu quis parar por aí, evitando todo o quarto de hora que viria seguir.

A impressão que me deu ao ouvir ‘Little by little’, a terceira, foi algo recorrente em quase todas as músicas do disco. Parece que tem uma outra banda com um DJ de drum n’bass terrível tocando por cima de uma gravação original. Talvez seja uma ótima forma de reduzir os custos. Talvez seja só experimentalismo, OH CRAP, de novo. Sério, ‘Little by little’ é uma excelente música infelizmente abduzida por batidas esquisitas e sons medonhos.

Então vem ‘Feral’ e novamente o Otto e aquela patifaria de gravação sobre gravação, quando um artista perde a mão e acaba colocando em sua obra muito mais do que ela precisa. A seguir, ‘Lotus Flower’, aquela da dancinha, uma das melhores do disco. Sem muita putaria, se é que dá pra me entender. Foi o teaser e eles estragaram tudo revelando a parte boa, usando assim a mesma técnica dos trailers de filme. Depois disso ‘Codex’, a quinta do disco, que traz seu piano intenso e menos confuso, a única música que poderia parar numa trilha sonora de filme, por exemplo. ‘Codex’ dá a consistência e a tranquilidade que o disco deixa estava deixando a desejar a té então.

Aqui podemos dizer que se eu pensava ter apenas não-músicas (como bem disse Chico Barney ao Popload) babacas, o disco volta a se tornar interessante com as duas anteriores e ‘Give up the Ghost’, no violão, aparentemente o segundo instrumento musical usado em The King of Limbs até aqui. Pra finalizar, ‘Separator’ e a música menos entediante de todo o disco, sem dúvida.