O homeoffice moleque e os amores brutos

Então tive de tomar algumas medidas para a ordem e para trabalhar de verdade não ficar naquelas ‘vou ver o Chaves e depois termino esse texto’: mantive o crachá no peito até a hora de ‘ir embora’ e o notebook ligado em horário integral(mesmo com o MSN invisível).

Ah, a possibilidade de trabalhar debaixo do cobertor!

Trabalhei bem, fiz o possível e o impossível, cacei códigos fonte, me virei com as imagens pequenas e meu photoshop ilegal. Terminei relativamente cedo, às 21h. Dava tempo de escrever meu aritgo já quase atrasado pro Per Raps. E então, 11 horas da noite, a Denise diz que vai sair tarde e que eu preciso buscá-la no trabalho.

Eu fico puto, grito petulância aos ventos, falo aos montes, pretendo criticar a empresa dela e dizer que está começando a me afetar e quero morrer quando ela diz que é a última vez que acontece. Daí quando a encontro não consigo manter nem metade do mau humor, dou risada e esqueço de tudo como se nada de ruim estivesse realmente acontecendo.

Isso, amigos, é amor bagarai.

(imagem via Wears heart on sleeve)

Deus e um rosário

Há pelo menos 10 anos, eu costumava andar com um rosário enrolado no punho direito. Sim, um rosário, esse pokemon evoluído do terço. Eu fui colaborador da igreja católica depois de um encontro de jovens, aos 17 anos. Então, digamos, quando você estava indo pra faculdade ouvindo AC/DC no CD Player, eu era o cara do seu lado quieto, de cabeça baixa e trocando as contas de bolinhas a cada oração. Eu tocava guitarra na missa, violão no grupo de jovens, pedia comida nas comunidades, me reunia para organizar as paradas e fazer um monte de gente maluca pensar algo além das festas juninas do bairro.

Era isso que representava pra mim, fazer alguém poder pensar, mais do que isso, era poder me ocupar em algo além de tocar violão e beber vinho no mercado. Ainda que você me diga que pensar em religião é um pensar menor, oblíquo e quase alienável, é um pensar. E isso, para muita gente vale mais do que qualquer faculdade. Sabe aquele pequeno trecho de um livro que mudou sua vida, aquela palavra que te deixou desconfortável na cadeira, aquela banda, aquele filme, aquele grupo, aquela época que foram essenciais e sem as quais você não teria livrado seu pensamento do Domingo Legal, Parangolé e Band FM? Algumas pessoas nunca tiveram seu ponto de mudança para um pensamento mais livre e desapegado do imaginário popular. E a religião pode funcionar como esse ponto.

Mas isso é bobagem. O negócio é que eu andava com as porcarias das bolinhas enroladas no punho. E as tiazinhas do ônibus adoravam puxar conversa enquanto eu trocava bolinhas, mesmo sabendo que eu teria de parar de me voltar ao CRIADOR DO UNIVERSO, para dar atenção a uma FREE TALKER COM SENSO DE OPORTUNIDADE. Eu era bem mais amargo que hoje, a propósito.

Hoje lia em frente à lareira saboreando um cabernet Sauvignon no trem, rodeado de gente feia, “Espere a Primavera, Bandini”, primeiro livro de John Fante. Um dos capítulos começa falando de Arturo, um dos meninos da história, que tinha certeza de que não ia para o inferno:

“A maneira de ir para o inferno era cometer um pecado mortal. Ele havia cometido muitos, acreditava, mas o confessionário o salvara. A confissão sempre chegava a tempo… isso é, antes de morrer. E batia na madeira sempre que pensava naquilo – sempre chegaria a tempo… antes de morrer. Por isso Arturo estava bastante seguro de que não ia para o inferno quando morresse. Por duas razões. O confessionário e a de que era um corredor veloz.”

Sou desses malandros que acreditam em Deus, mas ficam sem jeito de dizer que não são religiosos, como a definição pede. Existe um quase martírio ao admitir sua crença, mas também uma culpa mortal de negá-la e ser esquecido. Permanecer sozinho na imortalidade, como dizia a introdução de outro livro do qual já não me lembro.

Poderia omitir isso tudo, mas meu maior medo é o de que não exista nada. E estarmos levando toda essa vida desgraçada para inexistirmos, para termos existido um dia. E começo a me torturar pensando em quantas pessoas vão se lembrar de mim na virada do outro século (tá, tio, se o mundo não acabar em outubro). Olho para as pessoas ao meu redor no trem, apressadas e desgostosas, não parecem estar se importando tanto com isso. Mesmo com a falta de brilho no olhar, eles continuam tementes, inertes, caladas e distantes.

E então cheguei em casa e olhei para o rosário, pendurado na parede do quarto. E dei um nó cego em todo esse pensamento, pedindo a Deus que me garanta um pouco mais dessa ingenuidade bonita e menos dolorosa das pessoas do trem e de Arturo Bandini.

Onde vivem os monstros


Worried Shoes, Karen O & the Kids

A vida é esse grande supermercado de lembranças. A gente caminha pelas ruas e encontra num dos corredores aquele amigo com quem batia figurinhas na escola, aquela menina que te ensinou significados novos para a palavra “platônico”, embora não faça a menor puta idéia disso. Gente que fez diferença para que você construísse isso que você é.

Infelizmente, “isso que você é” não é algo que seja feito apenas de grandes gênios, bons corações e existências iluminadas. Acabamos invariavelmente encontrando também aquele setor abandonado de frutos do mar, uma bancada que cheira azedo e só pode oferecer pedaços de escamas perdidos entre o gelo, alguém de quem tentava se esquecer, alguém que traz seus pesadelos mais escondidos à tona, alguém que talvez não se importe muito com tudo isso e talvez nem saiba de que forma sua presença pode causar terror.

A gente sempre sabe. E passa batido, em frente, a mente tentando abominar a imagem, como a de um fantasma, um monstro que escapulira do armário de onde nunca deveria ter saído. Mas a lembrança continua com você, pra sempre. É ela que você carrega no carrinho, embaixo de todo aquele amontoado de potes de geléia e sacos de arroz de cinco quilos.

Não adianta esconder seus monstros, nunca adianta, eles sempre voltam. A única receita a tudo isso pode ser a mais fácil que é saber conviver com eles, que retornam em momentos inoportunos, como um nariz que sangra, para você lembrar quem foi um dia. Vão te dar aquele olhar de que sabem mais sobre você do que você mesmo. E voltam para aquela ilha escondida em um lugar qualquer que nossa alma cria.

Todo um pacote de ironias da vida

E hoje que voltei ao trabalho, mudei para uma mesa nova de uma outra pessoa e, nesse ínterim, discuto com a Denise nossas visões diferenciadas sobre casamento, nada demais, é normal acontecer uma vez que ela é a célula promissora do casal e eu o jerk que enxerga as coisas com bases na realidade etc.

Não vou expor toda minha opinião sobre casamentos aqui, mas com base no teor deste blog você deve ter uma mínima noção. Opinião essa que não é de todo enxaqueca, diga-se de passagem. Só mantém os pés no chão e coloca razão na idéia geral, mas a razão pode atrapalhar o que é sonho.

Daí que depois de magoados, toda aquela coisa bonita, eu olho para a mesa a qual meu computador foi alocado e…

Pra provar que meus títulos nunca são à toa.

PS.: perceba que, neste caso, ao contrário dos outros, é a mocinha que está triste e com uma arma na cabeça. =/

Ensaios de Férias

Daí você chega no trabalho e mudaram tudo. E você fica lembrando seus insights incríveis no chuveiro, com aquela euforia de que todo mundo vai ouvir suas idéias numa reunião cheia de risinhos de reconhecimento e cabeças confirmando tudo, olhares cínicos invejando seu júbilo, sinfonias tocando Wagner nos seus ouvidos ao sair da sala e um ‘belo trabalho, Robson’, sinal de gratidão, cereja do bolo.

Apesar de tudo, não foi nada tão assustador assim e basicamente vai continuar tudo a mesma coisa, por enquanto. Eu é que estava com planos demais na cabeça.

“É próprio das pequenas almas soterradas sob o peso dos negócios não saber se desprender totalmente deles, não saber largá-los e retomá-los”
–Montaigne, Sobre a experiência.

***

Finalmente terminei os Ensaios, de Montaigne. Assustadora e vergonhosamente, o primeiro livro do ano. Quase 600 páginas de puro êxtase filosófico sobre tudo o que a gente teme ou evita pensar. Aspas de Sêneca, Ovídio e vários outros clássicos que deveria ter lido há mais tempo, grandes citações, um volume da Companhia das Letras que me orgulho de guardar todo marcado com post-its e páginas amassadas, trademark dos vagões cheios na linha 9 da CPTM.

“Os Essais são um auto-retrato. O auto-retrato de um homem, mais do que o auto-retrato do filósofo”. Marquei isso na Wikipédia enquanto tentava definir minha sensação ao terminar o livro. E foi isso, exatamente. Fica nítida também a evolução ou amadurecimento do pensamento de um homem que troca seus primeiros escritos ferozes e cheios de vida da mocidade (olha, “mocidade” é uma palavra bonita em extinção) por reflexões sobre cólicas renais e males da medicina ao envelhecer.

Como a vida, sempre.

‘So sorry, that’s over’

Último dia de férias é o domingo mais longo do ano. É aquele climão do final do Fantástico elevado a potências de valor infinito. Sou eu assistindo Filhos do Pai Eterno na Rede Vida com meus pais às cinco da tarde, abençoando água e tentando zerar o Google Reader sem usar o ‘Mark All as Read’.

Em um balanço geral, as férias cumpriram bem o propósito e tal. Mesmo não conseguindo dar ok em metade daquelas metas que tinha previsto, descobri que esse período que te pagam para cochilar de tarde e ligar na portaria porque a molecada está brincando demais do lado do seu carro, é também uma época para lembrar como era aquele tempo em que você voltava da escola, não tinha quase nada pra fazer e podia passar suas tardes comendo Trakinas com leite e vendo Um Maluco no Pedaço, Chaves, Chapolin e Malhação (isso explica muita coisa).

Outra descoberta dessas férias é a de que não existe mais saída para o trânsito da cidade de São Paulo. Esse pessoal que diz “daqui a pouco, até domingo de tarde vai ter trânsito” já está bem atrasado. Duas vezes eu tentei sair de carro, uma para Pinheiros, outra para o Centro. Ambas, às duas da tarde e sem qualquer sucesso.

Bem, acabou. Foram dias em que deu pra ver como funciona meu bairro enquanto eu não estou aqui. As tiazinhas mancomunam o editorial de fofocas que irá pautar as reuniões no banco da rua de noite, que só vejo quando passo ao voltar do trabalho. Deu pra notar também que essa galera sempre feliz caminhando no mercado terça-feira às duas da tarde são apenas desempregados formadores de alguma triste estatística.

E, por aqui, estamos de volta com a programação “normal”.

Status das metas descumpridas

Postei uma lista das metas das férias e já comecei mal ao perder a sessão dupla do in Edit na sexta talvez com os dois únicos filmes que eu gostaria de ver na mostra, um sobre o Lost Poets e outro sobre a cultura folk nos anos 60? Talvez.

Poderia descontar o problema dizendo que prefiro ficar em casa passando o tempo com qualquer outra coisa inútil, mas o fato é que eu tentei duas vezes e desisti depois de falhar miseravelmente.

Na primeira tentativa, eu iria até Pinheiros ver os preços de um pedal para guitarra, um teclado controlador e consultar a reforma da guitarra. Bem, digamos que eram duas horas da tarde e eu só consegui chegar no Largo da Batata às 16hpouco, desistindo antes de chegar na Henrique Schaumann, se é que alguém conseguiu chegar aquele dia.

Esse tópico musical eu consegui, uma vez que acabei comprando o controlador no sábado e vendo o preço da troca de captadores para a guitarra no mesmo dia, embora não tenha sido exatamente como eu esperava.

E então, na sexta, iria ao MIS, num workshop sobre produção de vídeo, aguçado pela quantidade de clipes que vejo e parecem não ter fio condutor, ou serem variáveis de uma câmera na mão e uma idéia na cabeça. Claro, o cara tem uma idéia deslumbrante, executa em duas cenas
e depois tenta enrolar os outros 4 minutos de vídeo com qualquer bobagem.

Quando percebi que não iria chegar a tempo do workshop, decidi ir até a Matilha Cultural onde ia rolar a sessão dupla e onde, num misto de mal entendidos com o dono do estacionamento, os horários da Denise e da sessão, acabou não rolando. Nem pelo torrent, o que é bem mais triste.

Pois os dois primeiros tópicos falharam, not a big deal, eu diria. Ainda sobram meu MTB, os westerns, o livro, o Insanity. Bem, talvez o próximo post eu fale sobre como desisti deles também.

Uma cópia de uma cópia de uma cópia

Competindo arduamente com Beleza Americana e Franklyn (que preciso rever em caráter de máxima urgência), o Clube da Luta está no top 5 da minha vida. Não é só um filme de gente que briga, espero que vocês saibam disso. Se não souberem, por favor, aluguem, baixem, comprem. É desses filmes com personagens conturbados e problemáticos, com a história mais maluca e sensacional que conheci.

Definitivamente esse é o primeiro filme de minha lista.

Não é o primeiro da lista só pela história, mas sim por todas as cutucadas sobre a vida servil do homem moderno, sobre tudo que vai continuar fazendo sentido durante toda nossa vida. O Clube da Luta funcionou pra mim como aquele amigo punk que te leva para uma reunião do Comitê Anarquista de São Paulo na Av. Paulista (não sei se existe).

Foi o primeiro filme a me mostrar que existem coisas erradas demais no mundo que vivemos e como elas são mascaradas e fingidas para serem tratadas como normais e corretas.

E segue abaixo uma coleção de gifs do Clube da Luta. Não são todas as melhores cenas, embora todas sejam bem marcantes na história. Fica aí minha contribuição e uma boa oportunidade para rever o filme e lembrar do Helpful Tyler Durden:

Fiz isso com Requiem para um Sonho na era jurássica deste blog, just for the record.

Quer dizer…

Sou adepto a dar os parabéns a aniversários no Facebook. Acho de bom gosto, principalmente para as pessoas lembrarem do seu manter a atividade do perfil.

Daí que outro dia era aniversário de uma antiga conhecida, sobrevivente da faculdade. E comecei a lembrar que, na faculdade, tal qual em meu antigo emprego, um grupo de garotas costumava se chamar de Re, Fa, Si, Sa, então eu me graduei sem saber ao certo o nome de algumas pessoas.

E foi então que entrei no perfil da Regina desejando feliz aniversário para a Renata.

Good times are back again

Um filme que definitivamente preciso ver é esse Simple Man, ou Simples Desejo na versão em português. Porque um diálogo desses merece todo nosso respeito:

Ned Riffle: I want adventure. I want romance.
Bill McCabe: Ned, there is no such thing as adventure. There’s no such thing as romance. There’s only trouble and desire.
Ned Riffle: Trouble and desire.
Bill McCabe: That’s right. And the funny thing is, when you desire something you immediately get into trouble. And when you’re in trouble you don’t desire anything at all.
Ned Riffle: I see.
Bill McCabe: It’s impossible.
Ned Riffle: It’s ironic.
Bill McCabe: It’s a fucking tragedy is what it is, Ned.

Lembrei desse trecho numa vinheta do Reffer (que voltou a tocar!), na abertura de Interference, de 2001:

E só lembrei do Reffer essa semana porque os bons tempos estão de volta. Deixemos assim. =)