Os malfeitores do Google

Os filmes de Hollywood sempre trataram como vilãs empresas megalomaníacas como a Luthor Corp, Stark Industries, Skynet, esse tipo de coisas. Isso porque o mundo que vivemos é apático e nada muito significativo acontece diariamente. É um mundo em que se trabalha a maior parte de tempo trancafiado em uma ou duas instituições empresariais, mal tendo tempo para ver o sol (ou a verdade que está) lá fora.

Por isso tantos filmes de ação inebriantes, por isso Batman, Homem Aranha e Superman nos confundem com tantos conselhos, por isso aquela receita certeira de filmes homem-derrotado-muda-de-vida-extraordinariamente-e-salva-o-mundo. Porque precisamos de uma história que salve o mundo por nós, precisamos de zumbis para ter medo de algo além da escuridão do nosso futuro desconhecido, precisamos do Bruce Willis saindo do carro num cavalo de pau e atirando, porque os tiozinhos de 55 anos que conhecemos estão mais preocupados em se aposentar dignamente e ser bem cuidados pelos filhos quando o Alzheimer bater.

Porque a vida, resumindo, é entediante demais pra ser contada.

Todo este ponto que estou tentando provar é para defender a empresa vista pelos criadores de correntes de email teorias conspiratórias como a mais assustadora forma de dominação possível: O Google. Empresa que, ao invés de divulgar suas ações sociais, solta um videozinho no Youtube explicando onde foram parar suas contribuições para a humanidade em 2010:

É aquele negócio do jogador de futebol que ganha milhões pelo mundo, cria uma marca multimilionária e abre escolinhas de futebol no bairro humilde onde morou quando pequeno, para dizer ao mundo que se importa com algo além de seu carro, as vadias e a balada sem controle. E o mundo segue nessa ironia de que isso faz do jogador em questão um humanitário, envolvido diretamente com a causa social da qual é fruto. Não é. Se ele se interessasse, montaria um centro educativo, reformaria quadras públicas, ruas, casas, daria uma vida decente aos seus e não apenas a remota possibilidade de uma. Porque quem quer fazer alguma coisa pelo mundo não abre escolinhas com o troco do IPVA, nem se reúne na Paulista com 20 fãs achando que vai mudar muita coisa. Mas esse é assunto para um outro dia.

O Google e algumas outras empresas perdidas por aí sabem do valor que existe em construir 15 mil escolas na Índia, ou vacinar 50 milhões de crianças no mundo todo contra polio. É absolutamente o contrário do que ‘aprendemos’ nos filmes e muito mais do que se espera da atual maior companhia do mundo.

E o lado bom que sobra disso é que, se num futuro distópico qualquer eles usarem nossos dados pessoais para criar uma sociedade mentalmente aprisionada, talvez um dia possamos ver tiozinhos como Bruce Willis por aí rodopiando carros e descarregando suas uzis contra agentes do governo.

#festadafirma

Digamos que a amiga secreta em questão pediu três livros, dois de R$ 15,00 e um de R$ 9,90 em promoção bombástica no Submarino.

Digamos que o livro de 9,90 saiu da promoção no dia seguinte. E, quando comprei em outra loja, o livro voltou à promoção.

Não contente, digamos que o destino marcou o amigo secreto para amanhã e nenhum dos presentes chegou até o presente momento.

Diga não às drogas

Estava eu ano passado num show na quadra da Peruche, com o From.

Na fila, no meio de um desses small talks marotos com dois caras que estavam na nossa frente, um deles me solta ‘ah, mano, essa molecada de hoje tá perdida, é só funk, só droga, não tem mais aquilo de antes, entendeu, de curtir o som, ficar tranquilo, com seu pessoal, tals, os cara só quer saber de fumar, cheirar… não vira’. Continuamos a conversa até entrarmos e nos perdermos numa humilde multidão.

DJ KL Jay tocava uns clássicos enquanto eu esperava com o coração inquieto a entrada do show principal. Tomávamos uma cerveja inocente, falávamos alguma coisa sobre como a cena era forte, mesmo que descentralizada, não nestes termos, uma vez que ‘descentralizada’ não é uma palavra que você consegue falar quando está bebendo. De repente, malandrílson da fila passa pela gente frenético, pára com uma garrafa de catuaba e fala:

-Oooo, manos, trombei uns camaradas meus ali, vamo lá?
-Não, velho, tamos tranquilos, vai lá.
-Ah, demoro, mas aí, eles tão com vários pinos, se quiserem dar um ‘rata’, só chegar, firmeza, família? (i.e ‘temos cocaína, se quiserem usar, venham comigo’)
-heheh, ok.

Só pra ter certeza de que não tinha bebido tanto assim perguntei pro From se aquilo era verossímil, se o cara tinha realmente falado que odiava drogas e depois veio nos oferecer, destruindo em segundos sua imagem pré-estabelecida de crítico da juventude. Poderia aqui pontuar uma extensa lista de fundamentos morais que ele infringiu, mas não, afinal, ‘quem sou eu pra falar de quem cheira ou quem fuma?’. Essa é a crítica insider, um novo e inesperado mercado profissional pronto para decolar.

Ou não.

Retrieve your feelings

De tempos em tempos, fico lembrando quando foi que comecei a escrever meus blogs pelo Web Archive, esse site que recupera URLs esquecidas no tempo.

E sempre procuro o link do Caito*, que em 2003 mantinha textos e poesias em sua Casa do Pescador, já era meu poeta preferido, minha grande e contemporânea inspiração, além de um grande amigo.

Daí que lhe perguntei algumas vezes sobre uma poesia que ele havia escrito naquela época, mas ele nunca se lembrou. Falava sobre a procura de um amor. Queria o poema novamente, para guardá-lo e eternizá-lo como uma das maiores obras que li durante a adolescência. Hoje, eu o encontrei. E por mais que não faça o exato sentido de sete anos atrás, ainda me emociona de uma forma simples e grandiosa, que me joga sobre o rosto a importância de jamais se esquecer quem você é realmente.

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Jovem solteiro procura mulher
Cor dos olhos: tanto faz
Importante mesmo é o olhar
Renda mínima: tanto faz
Importante mesmo é lutar
Uma mulher que faça amor
As 7:0 da manhã
E que use roupas íntimas
Com estampa de bichinhos
Que ouça Elis Regina
E ouça Garotos Podres
Que se entorpeça comigo
Que me entorpeça
Que faça minha cabeça
E junte seu suor ao meu
Que perca suas pernas entre as minhas
Que entenda o que meu olhar
Diz nas entrelinhas
Uma mulher que me deite em seu colo
E me faça um cafuné nos cabelos
Olhando no fundo dos meus olhos
E cantarolando
“All you need is love”
Que cuide e deixe cuidar
Que ame e deixe amar
Que transe no elevador!
E que chore em meu ombro
Ao final de uma love story qualquer
Uma mulher que me ouça tocar
Uma melodia boba no violão
E ao som de cada acorde
Me olhe com tanta ternura
Que me sentirei quase um blues man
Uma mulher que beije
Morda
Arranhe
Afague
Que pense
Que brigue
Que implique com alguma amiga minha
Que reconcilie
Que beba uma cerveja comigo
Que leia um livro
Sublinhe uma parte bonita
E venha a mim recitar
Que me conte como foi seu dia
Eu ouviria com toda atenção
Uma mulher que durma abraçada comigo
Como seu eu fosse um ursinho
E só me largue na hora de ir trabalhar
Porque não tem outra opção
Que me de um apelido ridículo
Que eu direi que odeio
Mas irei amar
Procuro alguém para me apelidar
Procuro desesperadamente alguém para amar.

Caio Cezar Mayer, no blog Casa do Pescador, 2003

*’Caito’ é Caio Cezar Mayer e hoje escreve suas poesias no Sindicato do Escritores Baratos, ao qual tenho prazer de também deixar algumas poucas contribuições.

Essa é minha vida, esse é meu clube

Quando você se lembra que na tarde inconsequente do dia anterior você entrou na piscina com o pendrive no bolso e abraçado com um cabrito bebê, tudo começa a parecer mais estúpido do que o normal.

Dignidade, não trabalhamos.

Sujeira, mano, sou sujeira

O final de semana foi a prova definitiva para manter a última frase do meu perfil (ao lado) no lugar em que ela está. Ou trocá-la por ‘eu não presto, mano, sério’. Minhas expectativas não erraram. Eu, esse bêbado inconsequente e descontrolado, não mereço nada mais que uma vida merda. Obrigado, mundo, por fazer seu trabalho tão lindamente.

E toda essa indiferença, cara, vem de onde? Dessa vez eu não consigo me sentir completamente errado. E veja que, ‘completamente’ é o que dá sentido na frase. Eu sei do que devo e não devo fazer, embora possa ocorrer erros de percurso, inadvertidamente. O que não posso entender é como um erro pode anular todo o resto. Isso facilita bastante. Quando você tem tanta coisa boa pra lembrar, você não consegue imaginar como esse negócio de beber incontrolavelmente te faz um cara escroto do dia pra noite.

Talvez eu consiga guardar as alianças na caixa de recordações, ou alterar o status do relacionamento, ou devolver os livros dela que ainda nem cheguei a ler. Mas agora pouco, no carro, deixando ela em casa, tive a sensação de estar assinando um atestado de fracasso sentimental que vale pelo resto da minha vida.

Ela só era boa demais pra mim. =(

A vida é feita de escolhas

Confesso sentir uma inveja desmedida dessas pessoas que sabem exatamente o que escolher num bar, restaurante ou banca de pastel. Esses governadores da predileção, que sabem escolher cada ingrediente de seu ravióli do Spoletto como se fosse algo absolutamente óbvio.

Isso sempre me pareceu pouco fácil, se tornando um massacre sem tamanho ter de decidir entre pimenta do reino, milho ou pedaços de bacon (eu sempre escolho o bacon, BTW). Como naquele jogo do Big Bang Theory com perguntas do tipo ’em um mundo em que rinocerontes são animais domesticados, que vence a Segunda Guerra Mundial?’. Não existe lógica nenhuma, a não ser aquela que consigo inventar de bate pronto, em que o bacon e a ervilha tem nível 4 numa escala internacional de sabores, ficando abaixo apenas do alho poró e da cebola roxa, respectivamente.

Sem contar os fancy choosers e é desses que eu realmente quero falar. Do malandro que não sabe chegar numa barraca de pastel e pedir ‘um de pizza e uma coca’, ele tem que encher os pulmões e esvaziá-los dizendo: mê vê um de carne seca com cebolas picadas e azeitonas pretas chilenas, com um suco Del Vale de frutas cítricas no copo de plástico e dois canudos de cores diferentes.

Outro tipo clássico é o que não sabe pedir um café puro ou pingado e um pão na chapa. Ele precisa pedir um café espresso macchiato com bastante espuma e um sanduíche de queijo brie na chapa com algumas pitadas de cebola. Sempre a cebola, reparem, este é o condimento principal para se tornar insuportável.

A parte disso tudo, meu sério problema é com aquela cafeteria que salvou a vida de Michael Gates Gill. Não consigo pedir a bebida adequada em ocasião nenhuma. Sempre peço ‘aquele gelado de café e chocolate tamanho grande’ e sempre tenho respostas secas para confirmar quando o atendente me diz: ‘o senhor quer então o Frappuccino Blended Beverage Java Chip à base de café tamanho Venti?’. Daí respondo com aquele olhar cínico, esbanjando uma fingida superioridade: ‘claro, amigo, claro’.

Outro fato completamente insensato dessa minha vida infernal é que não consigo pedir pizzas além da prática, default e pouco espirituosa meia mussarella, meia calabresa. Embora eu devore todos os sabores sem nenhum problema, é necessário que, de alguma forma, em algum oitavo das pizzas haja queijo e calabresa.

É aí que está o segredo. Parece de uma frescura sem tamanho, mas é exatamente o contrário. Eu tenho uma boa relação com todos os sabores, o que não me confere exatamente a liberdade de optar pela quatro queijos em detrimento da marguerita, afinal que culpa ela tem? E assim eu sigo dramatizando conceitos culinários como respostas para minhas grandes fraquezas.

A síndrome de perdedor

O mundo faz com que eu pergunte se sou bom o suficiente, se sou o cara certo para a vida certa e me mostra três ou quatro linhas para seguir, três ou quatro rumos dos quais não posso escapar. Sorria como se você quisesse mesmo fazer isso, a música diz. Ou algo assim, não quero mais saber. Tento apenas não me importar, tentei a vida inteira não me importar, morrer na Lira dos 20 anos, virgem e eternizado como um doente maluco que não deve ser ouvido.

E, por mais que se tente jogar o jogo, com as cartas que nos deram, na mesa que nos colocaram, você sabe que algo está errado, fora do encaixe e você não deveria estar neste lugar, você não tem esse direito.

Não consigo lembrar quando foi que eu parei de imaginar a vida de um milionário. As pessoas desejam tanto ter dinheiro para esnobar, desfazer, destruir, humilhar. Eu não quero dinheiro. Nunca quis. Viveria bem se não precisasse dele. O homem fica perturbado quando deixa de querer ser rico. Você é criado com a premissa de que um dia vai querer ser rico, vai querer pisar e passar por cima de alguém, vai querer a boa vida.

Quando você não se importa, você passa a ser um perdedor maior que os outros, pela sua falta de ambição e cobiça, por não ostentar nada além de sua própria paz, deitado na cama, de seus braços cruzados por trás da nuca, batendo a havaianas na madeira da cama e imaginando o que pode acontecer depois. Por não querer um terno e um currículo impresso em pergaminho sagrado, você desiste de acreditar que um dia vai se pegar pensando em que carro dar para sua esposa de aniversário.

Pode ser a maior desculpa que já inventei para meu fracasso, mas não querer ser rico é também a minha verdade.

Até quando?

Apesar da minha linha de pensamento em que as pessoas só se metem em encrencas amorosas porque optam por fazer da vida uma grande escola prática de teatro, deixo vocês com essa reflexão de Nick Hornby, no melhor trecho de Alta Fidelidade:

I know I’m being stupid, but I don’t want her coming to my shop. If she came into my shop, I might really get to like her, and then I’d be waiting for her to come in all the time, and then when she did come in I’d be nervous and stupid, and probably end up asking her out for a drink in some cack-handed roundabout way, and either she wouldn’t catch my drift, and I’d feel like an idiot, or she’d turn me down flat, and I’d feel like an idiot. And on the way home after the gig, I’m already wondering whether she’ll come tomorrow, and whether it will mean anything if she does, and if it does mean something, then which one of us it will mean something to, although Barry is probably a nonstarter.

Fuck. I hate all this stuff. How old do you have to get before it stops?

Procrastinate now & Panic Later

Poucos souberam explicar a procrastinação como algo palpável. O ato de abandonar obrigações sem motivo – ainda que sabendo dos resultados desastrosos a que podem levar esta ação – é elucidado em O demônio da Obstinação, escrito em 1845 por Edgar Allan Poe.

O texto é um ensaio sobre o fator irracional nas decisões humanas, induzidas por um mal supremo que nos obriga a fazer o que não se deve. A última parte trata da história de um homem encarcerado que, vítima dessa obstinação se vê obrigado a confessar um crime que esteve sem solução durante anos.

E no trecho abaixo, Poe coloca uma luz de castiçal envenenada sob sua obra e destrincha nosso conceito contemporâneo de procrastinação:

“(…)Estamos diante de uma tarefa que cumpre terminar depressa. Sabemos que a demora significa a ruína. A crise mais importante de nossa vida nos chama, com um toque de clarim, à ação enérgica e imediata. Estamos radiantes, consumidos pela vontade de atirarmo-nos à tarefa, antecipando o glorioso resultado que nos põe a alma em chamas. Devemos, precisamos começá-la hoje, e, no entanto, a deixamos para amanhã – por quê? Não há resposta, salvo que nos sentimos obstinados, usando a palavra sem compreender seu princípio. O amanhã chega, e com ele uma ânsia ainda mais exasperada por desempenhar nossa tarefa; mas, junto com essa ânsia, surge também um desejo inominado, deveras temível – porque incompreensível – de postergar. O desejo ganha força à medida que o tempo passa. Chega o último momento em que podemos agir. Estremecemos com a violência do conflito interno – do definido contra o indefinido – da substância contra a sombra. Mas, se o embate chega a esse ponto, a sombra prevalece – lutar é inútil. É quando os sinos dobram por nosso bem-estar. Ao mesmo tempo, é o cantar do galo para o espectro que há tanto nos oprime. O fantasma esvoaça – desaparece – estamos livres. Recobramos a força de outrora. Já podemos trabalhar. Mas – ai de nós – é tarde demais.”

Edgar Allan Poe, em O Demônio da Obstinação, 1845