Mark as SPAM

Daí que eu trouxe pro trabalho meu fone Philips com tecnologia Noise Reduction, que me livra até 75% do mundo real no escritório. O único problema é que tem um telefone na minha mesa. E ele jura que eu preciso atender algumas ligações.

Vez ou outra esqueço e, ele toca intermitente, até que alguém me avise. Foi o que aconteceu. Quando atendi, uma moça de garbo elegância e digna colega de trabalho (Abravanel feelings) – conversava com alguém:

Mulher: Pede pra ligar e não atende, aquele gordo do caralho.
Eu: Ponto Frio…?

Ela desligou e então coloquei o fone no gancho pensando na hipótese de ter me tornado alguém insuportável pra essa gente bonita e respeitável.

Sérião, tenho um ou outro amigo que me chama de gordo do caralho. Não tenho problema algum em ser um gordo do caralho, geralmente dou risada e replico com qualquer outro jargão ofensivo ao conviva em questão.

Ouvir isso de alguém que trabalha com você, por telefone, tendo a certeza de quem foi que deixou isso escapar passa a exata sensação de ser um catador de lixo no natal e assistir o programa do Boris Casoy porque, oras, você acha ele um ótimo profissional.

Se nego chegasse na minha cara e me tratasse mal, dissesse abertamente que me acha um gordo do caralho, não me importaria. Voltaire com aquele papo de “Posso não concordar com uma só palavra sua, mas defenderei até a morte o seu direito…zzzz”. Enfia seu direito no meio do olho do seu cu e sai quicando. Não me importo, sério.

Esse é o tipo de coisa que acontece e você precisa jogar a informação fora. Excluir as imagens para um lugar esquecido no subconsciente, onde estão aquelas brigas que você perdeu e as namoradas que te traíram.

No fim das contas, esqueci a parada. Dei, na verdade, um belo Mark as spam mental.

Everybody is Gonna Love Today?

Lembro daquele dia que a gente desceu até o posto perto do trampo. Éramos pelo menos 12 pessoas do mesmo departamento da empresa. Todos juntos, bebendo com uma naturalidade adolescente e bonita. O clima era inocente, sem censura, uma dessas ocasiões da vida em que realmente conseguimos sentir na pele a juventude.

Meus amigos, juntos, rindo de piadas e conversas fiadas mais interessantes do que qualquer edição épica do Roda Viva.

Alguma vez na sua vida você se deparou com amigos que quer ter para o resto de sua vida? Aconteceu comigo algumas vezes. Estes, de que falo, são alguns deles. Pessoas da minha geração, gente que não imagina como alguém pode gostar dos estrangeirismos emo, mas que não consegue ficar sem repetir “everybody is gonna love today, gonna love today, gonna love today”, quando pega um vídeo do Mika no Youtube. Eles me trouxeram de volta à minha idade. Naquele dia, estava com os meus.

Mas então, meses depois, relacionamentos e desencontros vividos por estas pessoas transformaram essa “galera” num emaranhado de gente conspiradora, fofoqueira e, por que não, egoísta (Veja que falo aqui de meus amigos próximos que quando lerem isso vão me ligar pra dizer “WTF, nigga?”). Numa disputa de egos e molecagem hiperbólica, eles entraram – e me envolveram, de certa forma – num período que chamo de A Era das Tretas.

E nunca mais houve uma descida ao posto como naquele dia. Nunca mais o ar de tranquilidade, nunca mais uma noite sem conversas esquecidas atrás de cigarros e rodas de gente reunidas pra falar de outras rodas gente que se reunia pra falar de… você entendeu: o tipo de gente que assiste a vida dos outros como uma novela.

Meus amigos não se reuniram mais. Desci no posto algumas vezes, numa ou outra sexta-feira meses depois da Era das Tretas. Vazio. Olhava na iluminação distante, alguns carros embolados, mas não eram meus amigos, eram outras pessoas, bebendo com aquele clima que falava no começo deste texto.

Um deles certa vez me disse que as pessoas se desentendiam fácil e entravam nessas brigas tolas porque a amizade era muito precoce, então o respeito e as confidências amadureciam e envelheciam rápido demais. Faz sentido. Individualmente falando, quanto maior era a proximidade, mais aceitável era julgar alguém por seus atos e mais distante ficava a culpa. No resultado final, ficamos todos sem programações de sexta no pós-expediente. Mudaram as estações, as conversas, as pessoas. Não haviam mais as conversas por e-mail com 350 respostas, não havia mais cerveja na sexta-feira. E, de repente, não havia mais nada.

Talvez seja o preço pago por querer envelhecer rápido demais.

Síndrome de Trilha Sonora

Daí que eu saio do prédio para fumar, vou até o carro e vejo que estão implodindo qualquer coisa na Pedreira próxima ao trampo. Explosões, um nevoeiro foda no horizonte e eu pouco me lixando pra tudo, quando ouço:

“Hard as a rock, it’s hard than a rock”

Um cara fumava no estacionamento ouvindo AC/DC no celular. How convenient.

\

Certa vez, quando da minha fissura pelo The O.C – é, eu revelo cada coisa neste blog, depois explico melhor – gravei todos os seis CDs da trilha sonora para vir ouvindo no carro. Ligo no Dandy Warhols e saio. Esqueço a música quando começa a introdução com uns chiliques alternativos, vou passando pelo condomínio e vejo três amigos de infância sentados no banco da alameda, às 10h da manhã, porque ócio de verdade precisa ser demonstrado inloco. Me passou uma breve nostalgia ao ver os três e lembrar deles naquela fita cassete de um aniversário em 92. E então o Dandy Warhols começa a cantar:

“A long time ago, we used to be friends”

Eu tive medo.

#001

e estes olhos tão pequenos?
são para verter lágrimas, filho.

–semana tensa.

Sou Winston

Comedido, inexplicável. Tornar-se adulto é fazer parte do bando, da multidão de gente sozinha. Engrenagem da máquina, funcionário, cidadão padrão. O “sistema” que antes parecia só uma palavra boba em músicas de protesto se faz presente como nunca antes. Preso sem correntes, numa verdadeira detenção sem muros. É proibido olhar e sentir, é proibido ser.

Sou Winston e aprendi a odiar o Grande Irmão.

Adeus, Internet Móvel

Bem, bloquearam minha linha telefônica um dia antes do meu aniversário (isso vai estar também no post final sobre o inferno astral deste ano). Não recebi ligações dos milhares de amigos espalhados pelo país de meus 6 amigos atuais, nem vi as mensagens, e-mails, nada.

Por que? Porque eu não paguei.

Primeiro, me cobraram o dobro do valor nos últimos dois meses. Quando li a frase “Chegou sua conta” no envelope, imaginei alguém da Vivo segurando a risada e me entregando o envelope.

E eu, que só usava o smartphone por conta da internet móvel, ainda tentei explicar para a moça do atendimento que era uma cobrança indevida. Mas ela só fez parcelar em tantas vezes e me cobrar até o mês que eu não usei.

Vivo, incompreensão como nenhuma outra.

Agora, se me derem licença, vou desbloquear o celular, esquecer a Vivo e abraçar o SPC-Serasa. Bem-vindos à minha vida.

Robson Assis abandona a vida móvel deixando uma conta ativa no foursquare com seis badges.


Nossos sentimentos à família.

JCVD, a comédia da vida pública

“Um ator, um lutador, um mito”. Se eu escrevesse roteiros pra TV, ia querer começar a crítica para este filme assim. Pois bem. Ontem parei pra assistir JCVD, esse documentário ficcional sobre a vida do Van Damme lançado em 2008 que encontrei na banquinha de DVDs piratas na esquina de casa e pouco conhecido.

Uma comédia pastelão é o pano de fundo para tratar das tragédias na vida pública de Jean-Claude Van Damme, que interpreta a si mesmo. Vítima do equívoco ao entrar numa agência dos correios que está sendo assaltada, é forçado a usar os resquícios de sua celebridade em favor dos bandidos.

À sua maneira inconveniente e divertida, o filme vai caminhando para lugar nenhum durante pouco mais de uma hora. Entre trapalhadas de ladrões e oficiais de polícia semi-nus, momentos de crise como uma conversa de Van Damme com seu empresário, ou as repetidas vezes que fala ter perdido seu papel em determinado filme para Steven (Seagal), você vai sacando que o filme é na verdade um grande desabafo.

E aí, no meio de uma cena, o inesperado. Van Damme é tomado por um desespero doentio dos seis minutos que valem por todos os outros 91. Fala sobre sua vida, seus erros, seus fracassos e más escolhas. A performance deste seu monólogo garantiu a ele o segundo lugar num Top 10 da revista Time:

“Este filme é para mim. Cá estamos nós, eu e você. Por que você faz isso? Ou por que eu faço isso? Você faz meus sonhos se tornarem reais. Eu pedi por isso. Eu prometi a você algo em troca e eu não fiz minha parte. Você vence. Eu perco. A menos que o caminho que você definiu para mim seja cheio de obstáculos onde a resposta vem antes da pergunta. Sim, eu faço isso. Agora eu sei porque. É a cura, pelo que tenho visto aqui. Tudo faz sentido. Faz sentido para aqueles que entendem. Então… América, pobreza, roubar pra comer… Perseguir produtores, atores, estrelas do cinema, ir a boates na esperança de ver uma celebridade com minhas fotos, revistas de caratê. É tudo o que eu tinha. Eu não falava inglês. Embora tenha feito 20 anos de caratê. Porque antes eu não era assim (mostra o bíceps).”

Travestido de caráter confessional, com JCVD Van Damme diz ao mundo que não é um exemplo, que trilhou os caminhos errados e tomou atitudes que não deveria. E o que seria uma comédia de baixo orçamento se transforma de um minuto pro outro num grande drama auto-biográfico.

Estando eu também farto de semideuses, me sinto confortável pra citar Fernando Pessoa:

“Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?”

O filme é tão bom que sequer mencionei a palavra “espacate”. Ops.